segunda-feira, 18 de junho de 2007

ANIVERSARIANTE DO DIA: PAUL McCARTNEY

Hoje ele completa 65 anos e eu acho que merece ser comemorado. Eu sei que um monte de gente acha (como eu) que Paul McCartney era o lado “certinho” dos Beatles. Ele conseguia me irritar com aquela vozinha chorosa, melosa, açucarada que toda hora ele inventava fazer. Here, there and everywhere é uma canção linda, mas lá vinha ele com a tal da vozinha... Mas isso é uma óbvia injustiça – Paul McCartney é um dos maiores compositores de canções de todos os tempos. Vamos começar com um exemplo um pouquinho menos conhecido e que demonstra o que quero dizer: uma harmonia, uma seqüência de acordes, que parece existir desde sempre – embora não exatamente assim; sobre ela, uma melodia que vai voltar de repente, que vamos nos pegar assobiando quando menos esperarmos; uma letra singela, capaz de criar em nós uma identidade muitas vezes misteriosa.
Paul McCartney - Blackbird



Em 29 de agosto de 1966 os Beatles se apresentaram em São Francisco, na Califórnia. Como sempre, acharam que ninguém ouvia o que estavam cantando, que ninguém parecia interessado e eles estavam exaustos daquilo; além da preocupação com a segurança, com as freqüentes ameaças dos malucos. Não houve qualquer tipo de aviso, ninguém sabia que aquela seria a última apresentação pública da banda; logo depois eles anunciaram que nunca mais fariam shows ou participariam de turnês. Os Beatles de agora em diante só se reuniriam para gravar. Dez meses depois, em junho de 1967 – portanto um aniversariante que comemora 40 anos este mês - apareceria o primeiro resultado dessa concentração que eles quiseram e que tinham agora – o álbum que, pra muita gente, é o melhor que eles realizaram, Sgt.Pepper’s Lonely Hearts Club Band. Se Revolver foi o disco de experimentar sem medo, este era o disco da experiência polida, refletida e realizada com calma, capricho, sofisticação. Ali a crítica reconhecia que rock n’ roll podia ser arte – sem que isso significasse que não tivesse mais senso de humor. Cada um dos quatro pode realizar suas mais ambiciosas fantasias musicais e George Martin teve todos os recursos técnicos que necessitava. O disco era uma obra concebida e realizada como um todo, para ser ouvida e compreendida do início ao fim. Isso não era inédito, mas era novo para milhões de jovens do mundo inteiro para os quais aquele disco tão esperado cumpria a promessa de que eles tinham uma cultura deles, com seus próprios gênios criando suas obras-primas.
Paul teve a idéia em um avião em Los Angeles – e se eles não fossem mais eles? E se fizessem um jogo de se “esconder” na identidade de um grupo com um imenso nome absurdo? Anos mais tarde eles declararam que estavam exaustos daquela história de Beatles; eles não eram mais garotos nem rapazes, nem eram “performers”, uns caras bonitinhos no palco fazendo as meninas gritarem. Eles eram adultos e eram artistas, e estavam dispostos a tudo para prová-lo. O jogo e a aparente brincadeira eram, no fundo, uma busca de liberdade artística. Paul McCartney canta Sgt.Peppers Lonely Hearts Club Band com o U2.


Aquele ano teria ainda o álbum Rubber soul, um salto na qualidade das letras das canções e nas experiências de George Martin com o grupo. Eles já estavam mostrando que não seriam para sempre os rapazes bem comportados que as meninas que gritavam, que as mães certinhas e os pais preocupados queriam que eles fossem. Suas letras começavam a se tornar ambíguas, complexas, sem um sentido óbvio. Cada vez mais instrumentos estranhos aos grupos de rock vão aparecendo. Em Norvegian wood aparece uma cítara e em Michelle uma guitarra grega; no trecho instrumental de Think for yourself um piano com sonoridade de cravo. Como Lennon e McCartney estão tentando marcar suas personalidades musicais o disco acaba sendo uma vitrine de canções incríveis dos dois. Mas o calendário da Beatlemania ficaria mesmo marcado pelo sucesso mundial, primeiro lugar em todas as paradas de sucesso, de uma canção lenta, um pouco triste, com uma combinação instrumental que teria mandado para o olho da rua qualquer diretor musical – Yesterday é cantada apenas por Paul com um violão e um quarteto de cordas. Era só isso, e o mundo adorou.




Mas a dupla dele com John Lennon era mesmo da pesada – Eleanor Rigby é o exemplo obrigatório. Mas ela não era só do Paul? Pois é...





O álbum duplo White album tanto pode ser visto como uma experiência frustrante quanto interessante pela mesma razão – o disco é uma confusão. Paul não parece nos seus melhores momentos, mas experimenta em várias direções com Honey pie, o country Rocky racoon, a divertida Ob-la-di, ob-la-da e, acho que a mais interessante de todas, Helter Skelter, um antepassado da metaleira. Paul está outra vez escrevendo uma das suas mais belas canções. John estava se separando da mulher, Cindy, para ficar com Yoko e uma das coisas mais duras era perder o convívio com o filho, Julian. Paul, que era como um tio para o menino, estava sofrendo por esta separação, como também não estava tranqüilo sobre seu parceiro desde a chegada daquela poderosa e estranha garota japonesa. Ele apareceu com essa canção como se fosse para Julian, mas John entendeu cada palavra como sendo para ele. Paul não queria que George tocasse guitarra nessa música; não queria ofender o amigo, mas também não fazia diferença se isso acontecesse, desde que não aparecesse nenhuma guitarra. Quando percebeu isso, teve o primeiro sinal de que os Beatles não durariam muito mais. Bom, estas são algumas historinhas dessa grande canção: Hey Jude. Esta gravação foi feita em um show em homenagem ao nosso aniversariante, no mesmo Royal Albert Hall aonde estávamos assistindo ao Concerto para piano de Grieg. Os convidados são muito especiais.




Logo viria, em setembro de 1969, Abbey Road, o último disco dos Beatles a ser gravado e que, por causa do tempo gasto em Let it be no trabalho de estúdio, foi lançado antes. O grupo continuava obstinado, trabalhando sua arte e esta foi a despedida. Nunca harmonias tão lindas foram ouvidas em um grupo de rock, nem guitarras tão pesadas e furiosas ou aqueles sons estranhos do sintetizador Moog. Come together é uma obra-prima. George Harrison floresceu como compositor neste seu caminho de duas músicas por álbum e agora tinha para apresentar canções como Here comes the sun e Something. Este é o único álbum do grupo que pode ser comparado a Sgt. Pepper’s.

O último álbum a ser lançado, foi então Let it be, o único disco dos Beatles recebido pela crítica com hostilidade. O disco foi gravado com muita antecedência, mas o produtor Phil Spector resolveu realizar algumas melhorias de pós-produção e mixagem em estúdio, trabalhando em separado com cada um deles, nunca com a banda inteira. O uso de instrumentos de cordas também foi muito criticado. Let it be também foi um filme que retrata, que documenta os ensaios e as gravações do disco, deixando claro que a banda sofria de tensões internas pesadas – como vocês verão a seguir. Como sempre, há uma coleção de canções de primeira linha. Mas as crises já eram então incontornáveis e, no dia 10 de abril de 1970, Paul McCartney anunciou que estava deixando os Beatles por causa de “diferenças pessoais, comerciais e musicais”. Durante muitos anos houve esperança de que eles se reunissem mais uma vez, pelo menos para um grande show. Isto nunca aconteceu e se tornou impossível em 8 de dezembro de 1980, quando John foi assassinado. É difícil escolher a música para encerrar esta conversa. Dá vontade de ouvir uma porção de canções, mas acho que a melhor seria esta que o Paul compôs depois de uma noite em que sonhou com sua mãe que já tinha morrido há dez anos, quando tinha 14 anos. Ele estava atravessando uma fase difícil por causa das drogas, e teve um sonho em que ela lhe dizia que “tudo ficará bem”. Para terminar, Let it be.

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